Arquivo mensal: agosto 2009

e tudo se resume

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a pior coisa do mundo é a indefinição. é possível aprender a lidar, com o tempo, com uma situação ruim, com uma sacanagem que alguém lhe fez ou com um grande azar. qualquer adulto bem resolvido deveria poder, com alguma paciência e terapia, sobreviver a essas pequenas tragédias cotidianas, uns muito bem, outros nem tanto. mas como lidar com um problema, quando ele ainda não se apresenta pronto e acabado na sua frente?

muito fácil, você diria. se ele ainda não está lá, é porque não existe, portanto não seria fonte alguma de preocupação. errado. ele existe porque todos os dias eu sinto os seus efeitos, todos os dias esse problema consome minhas horas, meus neurônios, minha ansiedade crônica. ele existe porque todo santo dia alguém me pergunta sobre ele, no supermercado, na livraria, na festinha. só que até agora não se decidiu, formalmente, como é que esse problema vai ser enfrentado, então eu fico esperando.

esta semana se decidirá sobre um processo que tem consumido esses últimos 16 meses da minha vida. parece grande coisa, mas não é. do ponto de vista prático, é só um emprego. do MEU ponto de vista, é aquilo por que briguei, passei noites insones, dediquei fins de semana, feriados e férias. durante 16 meses eu me preparei pra isso, fiquei feliz com isso, sofri e descabelei com isso, e pode ser que sexta-feira eu tenha algum tipo de definição. ou não. pode resolver os próximos 30 anos da minha vida. pode descambar pra uma briga feia. pode me fazer cair em depressão. pode me impulsionar pra tentar algo novo. como saber?

de qualquer jeito, eu só espero a decisão. eu quero que alguém defina o que é que eu vou ter que fazer. quero me libertar de ter que contar com esse sim ou não pra saber se eu posso respirar.

aditivos pra quê?

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odeio botar combustível no carro. na minha cabeça, eu deveria poder chegar no posto, pedir 50 reais de álcool, e ir embora. Mas não.

começou com um “dar uma olhada na água e no óleo”… bem, o óleo eu sei pra que serve, mas e a água? Eu fico com medo de descobrirem algo horrível no carro (= gastos e dor de cabeça), e sempre agradeço e digo que estou com pressa (o que é verdade, 100% do tempo).

aí passaram a perguntar se eu não queria botar a gasolina aditivada, enquanto desfiavam todas as maravilhosas qualidades desse combustível. sempre agradeço e digo que fica pra próxima.

então oferecem água e cafezinho, que eu também nunca aceito. jornal, troca das paletas do vidro, troca do extintor de incêndio, aditivo de motor, calibragem de pneus, lavagem grátis com 15 carros na fila…

fico estressada. estou com pressa, quero apenas alguns litros de qualquer coisa no tanque pra ir embora. mas a verdade é que eu sempre saio do posto com a certeza de que, a qualquer minuto, o carro vai quebrar porque eu sempre agradeço e vou embora, achando que o bicho não precisa de nenhum mimo pra andar sozinho.

disco quebrado

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a minha vida é lugar-comum. a sua vida, muito provavelmente, também é. talvez ambos nos incomodemos com isso. mas, assumindo que você é uma pessoa mais ou menos como eu, é certo que a gente vai passar o resto da vida fazendo muito pouco pra mudar. mas reclamando sempre. porque reclamar é o lugar-comum que todo mundo tem em comum.

bem, quase todo mundo. domingo de noite fui ao depósito da tok&stok pegar uns bancos que esperavam lá por mim há dias. Cheguei dez minutos antes do fim do expediente, mas o cara que me atendeu, desenrolou tudo (eu tinha esquecido o papel), carregou os bancos e os acomodou no carro trabalhava com um sorriso na cara e com evidente alegria, sem nenhum sinal de cansaço ou irritação. Esse cara merece uma medalha.

eu, igual a quase todo o resto da população, volto pra casa reclamando, achando tudo tarde demais pra ser diferente e sonhando, talvez inutilmente, com o dia em que eu vou descobrir que posso fazer alguma diferença. ainda não sei em que lugar incomum eu me sentiria confortável. o pior é que talvez esse seja o mais banal de meus lugares-comuns.

acabou e não foi como eu imaginava que seria

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Oh, Brasília. Para poucos dias, foram muitas reflexões. Brasília é, pra dizer o mínimo, uma cidade estranha. Enquanto toda cidade nasce da aglomeração de pessoas, BSB foi posta no mundo às avessas; uma cidade erguida no meio do nada pela força inquebrantável do poder. O poder pode tudo, e assim se fez Brasília.

É curioso para quem vive no meio jurídico passear pelo centro das decisões (acredito que o correspondente para quem trabalha com negócios e dinheiro seja São Paulo). Fiz, é claro, as visitas de estilo. Ali, de onde sai o núcleo do que estudo e me esforço para compreender (às vezes é tarefa impossivel), tudo é inóspito, vazio, frio, povoada a cidade por autômatos de crachá muito orgulhosos de seu poder. Brasília me fez sentir, ao contrário, bem pequena e insignificante. Mas a questão é: eu gostaria mesmo de fazer parte daquela elite que come caro, mora mais caro ainda e se encapsula em escritórios para comparar poderes como num banheiro masculino? O meu é maior que o seu.

Curiosamente, o episódio que melhor simbolizou minha visita à capital se passou no Itamaraty. Quando eu acabara de entrar naquele palácio que sempre simbolizou meus sonhos (adolescentes?) de ser diplomata cosmopolita culta e influente, cheia de idéias e desafios, tocou meu telefone. Era um amigo, me informando da publicação do edital do concurso para procurador do estado. Desliguei com lágrimas nos olhos, e me senti tomada de tristes resignações. Eu brigo muito para sonhar, mas a realidade prática e suburbana da minha vidinha pacata logo me exige acordar.

Cristovão Tezza. O Filho Eterno.

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“Assim, em um átimo de segundo, em meio à maior vertigem de sua existência, a rigor a única que ele não teve tempo (e durante a vida inteira não terá) de domesticar numa representação literária, apreendeu a intensidade da expressão “para sempre” – a idéia de que algumas coisas são de fato irremediáveis, e o sentimento absoluto, mas óbvio, de que o tempo não tem retorno, algo que ele sempre se recusava a aceitar.  Tudo pode ser recomeçado, mas agora não; tudo pode ser refeito, mas isso não; tudo pode voltar ao nada e se refazer, mas agora tudo é de uma solidez granítica e intransponível; o último limite, o da inocência, estava ultrapassado; a infância teimosamente retardada terminava aqui, sentindo a falta de sangue na alma, recuando aos empurrões (…)”

heart – daddy – still

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Domingo é dia dos pais e eu resolvi, mulher casada, que vou fazer um almoço aqui em casa pro meu papai, minha mãe, minha irmã, minha avó e meus enteados. Vou fazer rosbife, o prato preferido de meu pai (ainda liguei pra minha mãe, pra tirar dúvidas…). Me dá um estranho prazer isso de chamar meus ascendentes para a minha mesa. A coisa da inversão de papéis, passar de ser a alimentada para ser aquela que põe a comida no prato. Ando estranhamente feliz com essas ocasiões, quando consigo juntar a família (minha ou a de meu marido) em torno da mesa. Faço planos, trabalho feliz. Parece que me sinto poderosa, matriarca, aglutinadora.

Aí eu combinei com minha enteada de irmos ao shopping no sábado comprar um presentinho pra ela e o irmão darem ao pai. E eis que, do alto dos seus seis anos ainda incompletos, ela me fita e dispara “tem richards no plaza, nine?”. Então, depois do golpe já imaginado na minha conta bancária,  eu entendo: não, eu ainda não estou pronta pra inverter, ainda quero que meu papai me dê presente no dia das crianças. De preferência da Richards.

dona da casa

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amanhã a nova empregada começa a trabalhar. no processo entre a saída da anterior e a chegada da nova, caiu a ficha de que eu não sei orientar empregadas. tenho dificuldades em dar ordens, mandar fazer isso ou aquilo, assim ou assado, e acabo ficando calada, o que é um grande erro.

e me dei conta de que essa minha inabilidade decorre do fato de que, desde que eu me entendo por gente, a casa da minha mãe sempre teve a mesma empregada. sandra é quem sabia onde ficava tudo, o que fazer pro almoço, se era pra fazer feijão ou se era ou não dia de trocar as toalhas. era raro eu ver mamãe dar ordem na casa; ela chegava, saía, a e coisa andava toda no piloto automático.

sem perceber, a gente importa a casa dos pais, né? mesmo jurando que vai fazer tudo diferente.